segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Apenas uma Onda

Foto: Arquivo Pessoal


Ela surgiu como um leão.  Veio em minha direção, louca para abocanhar meu coração. Talvez minha alma. Olhos vermelhos, cabelos negros ondulados, esvoaçando ao vento. Anoitecia. O sol acabara de sumir no horizonte e o céu exibia uma coloração avermelhada e quente.
Ela veio em minha direção, soberana. Sua imagem - aos meus olhos - era gigantesca. E eu ali parado, encolhido, sem saber o que fazer. Só esperando o que iria acontecer. Ela olhou-me, me cheirou. E riu, riu e riu. E se foi. Seu andar sinuoso a levou para longe até eu não poder mais vê-la. Não me mexi. Escureceu e eu permaneci ali, quieto, sem movimentos, sem pensamentos, sem ação alguma. Como um nada.
O que aconteceu? Finalmente perguntei. Ela não ia me devorar? Agarrar-me, me arranhar, sei lá? Ao invés disso deu uma sonora gargalhada e partiu. Eu sei porque. Faço-me de bobo, mas eu sei muito bem porque.
Não vem ao caso explicar, seria desqualificar meu interlocutor. Mas o fato foi esse. Ou não foi? Talvez tenha sido apenas um delírio, um sonho. Algo que eu quis que acontecesse apenas. Às vezes eu faço isso. Fico imaginando vidas possíveis, onde sou um grande herói, que faço e aconteço, ou que nem faço nem aconteço. E às vezes, me perco nessas ilusões, misturo tudo, e nem sei mais o que é real ou imaginário. Mas quem sabe? O que eu estou vivendo agora é real? Quem garante que não é só imaginação minha ou de alguém imaginando por mim? No universo, meu amigo, tudo é possível. O que achamos que é o mundo real é uma mera ilusão de ótica, é apenas o que nossos sentidos podem captar, mais nada. E às vezes, o que imaginamos se torna real, e o real se torna imaginário. Ou não.
Eu não tinha ação, e ainda não tenho. Foi isso que a afugentou. Pra que serve um inativo? Um ser que só espera? Que deixa que a vida siga o curso que outros lhe dão? Ela não queria um coração sem ideais, uma alma sem poesia, por isso se foi. E ainda riu de suas pretensões.
Está escuro! Levanto-me, corpo dolorido, pés adormecidos. Tento caminhar, mas não vejo quase nada. Apenas uma lua tão fina, como se fosse um pequeno corte no céu. Está frio, sinto o vento castigando meus braços nus. Respiro lentamente e com dificuldade. A cabeça roda. Mas por que? Eu não bebi, não ingeri droga nenhuma. Eu não entendo. Realmente não entendo. Penso em gritar, mas lembro que alguém pode ouvir. O que pensarão de mim? Ou alguém pode não gostar e me xingar. Não sei. Só sei que permaneço calado. Penso em soltar um palavrão, mas e se Deus me castigar? Será que ele existe? Deus? Sei lá, só sei que fico calado. Dou um passo à frente, depois outro, e outro e, lentamente caminho em direção a areia da praia. Ouço o murmúrio repetitivo das ondas. Penso que cada ser humano é como uma pequena onda. Começa ali pequenina e vai subindo aos poucos, cresce, depois quebra e morre na areia da praia, e depois, mais nada. Vem outra onda e outra e outra, e não para nunca. E é isso aí.
Lá está ela caminhando na beira do mar, as ondas molham seus pés. Ela corre e sorri, abraça e beija alguém que esta com ela. Ele a pega no colo e gira-a no ar, corre para dentro d’água e a atira no mar. Ela levanta-se e o persegue jogando água e sorrindo.
Eu fico aqui, braços cruzados, parado, olhando a cena, até que ela vai embora. A praia está deserta. Sento-me na areia e choro, minhas lágrimas desaparecem na areia. Respiro com dificuldade. Demora, mas adormeço. Sonho coisas desconexas e inexatas, não me lembro direito. Um sonho sem cores e com imagens enevoadas, onde não se distingue nada. Acordo assustado com a água gelada do mar que subiu. Volto para onde estava antes. Sento-me e me encosto na palmeira. O corpo dói todo. Demoro ainda mais a apagar. Queria pensar um pouco mais, quem sabe amanhã...

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